O secretário licenciado dos Transportes Metropolitanos, Alexandre Baldy, deu uma entrevista ao Jornal Folha de São Paulo e esclareceu diversos pontos após ter sido preso na semana passada, durante uma operação da Lava Jato.
Confira abaixo a entrevista completa:
Licenciado da Secretaria de Transportes Metropolitanos do governo João Doria (PSDB-SP), desde que foi preso, na semana passada, sob a acusação de receber pagamentos ilícitos de empresários, Alexandre Baldy afirma que foi “violado em meu direito de defesa”.
Na quinta (6), ele sofreu ainda uma operação de busca e apreensão que encontrou R$ 90 mil em sua residência de Brasília e mais R$ 110 mil em sua casa em Goiânia.
Baldy afirma que “cada centavo” encontrado nos imóveis está declarado no Imposto de Renda e diz que o dinheiro é “fruto de trabalho, suado, lícito e moralmente correto”.
Dizendo-se “assustado” e “triste” com a prisão, ele afirma ser hora de refletir se segue na vida pública. “Todos os meus familiares sempre foram contrários”, diz.
Baldy é o personagem principal de uma delação premiada feita por empresários da área da saúde em 2019.
Segundo Edson Giorno, Ricardo Brasil Correa e Manoel Correa, ex-gestores da organização social Pró-Saúde, eles repassaram um total de R$ 1,4 milhão, em dinheiro vivo, para que Baldy facilitasse pagamentos do governo goiano ao Hospital de Urgência da Região Sudoeste, em Goiás.
Além disso, quando era deputado federal, de 2014 a 2019, ele teria dirigido a contratação de uma empresa deles, a Vertude, por órgãos públicos comandados por seus afiliados políticos. “Não recebi, não ajudei, não participei”, diz Baldy, afirmando conhecer apenas um dos empresários, e de forma “superficial”.
Ele concedeu a entrevista ao lado do advogado Pierpaolo Bottini, que obteve, no STF (Supremo Tribunal Federal), a concessão do habeas corpus que garantiu sua liberdade.
Delatores que comandaram empresas da área de saúde afirmam que o senhor os ajudou a resolver pendências e facilitou a contratação de seus serviços em órgãos públicos. Em um dos casos, para colocar em dia o recebimento de pagamentos devidos pelo estado de Goiás a um hospital administrado por eles, teriam sido dados R$ 500 mil ao senhor, em dinheiro vivo. Como se deu essa relação?
Eu desconheço essa história. Não tenho absolutamente conhecimento nem responsabilidade sobre esse tema. Nem sobre qualquer outro que eles colocam. Refuto e nego completamente. Não recebi, não ajudei, não participei.
O senhor conhecia os delatores? Um deles, Edson Giorno, diz que desenvolveu uma relação de amizade com o senhor.
Tinha uma relação superficial com ele, como tenho com milhares de pessoas. Mantive um contato parcial em determinados períodos. Com os outros, não tinha relação nem conhecimento.
Há relatos de encontros do senhor com Edson Giorno. Para que eram esses encontros?
Sinceramente, não tenho essa lembrança. Não tenho como lhe afirmar se estive presente ou não [em algum encontro com o empresário]. Vi que consta até uma fotografia [nas peças de delação]. Mas, sinceramente, não tenho como afirmar. Estou buscando em algum arquivo, na memória, para saber se estive presente em algumas das vezes [que o delator cita que se encontraram].
Eles dizem que os encontros serviam para a entrega de dinheiro de caixa dois para a sua campanha a deputado federal, em 2014. Eles contribuíram? O senhor pediu alguma ajuda?
Não.
Os delatores dizem que as tratativas com o senhor eram feitas por meio do empresário Rodrigo Dias. Ele é seu amigo?
Rodrigo Dias é meu primo, salvo engano, de sétimo grau. Não posso responder por terceiros. Posso responder por mim. Não tenho ciência se ele ou qualquer outra pessoa fez qualquer tipo de compromisso ou de diálogo diferente do que eu possa fazer. Para mim, tudo foi novidade. Jamais esperava por esse tipo de situação. Que realmente cada um responda por seus atos, suas falas, suas atitudes. Eu posso responder com toda a serenidade sobre os meus atos.
Uma outra acusação é que Rodrigo Dias foi posteriormente indicado pelo senhor para presidir a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), direcionando a contratação dos empresários agora delatores pela Fiocruz. Em troca, o senhor teria recebido R$ 900 mil. Ele foi indicado pelo senhor?
Rodrigo foi indicado [para a Funasa] pela bancada do Podemos [partido ao qual Baldy foi filiado até 2017], inclusive por meio de uma votação [entre os parlamentares].
Não tive nenhuma interferência em qualquer tipo de tratativa que ele tenha feito em sua gestão, como não tive em qualquer uma das outras [situações apontadas pelos delatores].
E a troco de que essas pessoas envolveriam o nome do senhor?
Há uma delação e é claro que as pessoas [delatores] colocam o que lhes for conveniente para obter algum benefício por parte da Justiça.
Eu respeito as instituições. Respeito o Ministério Público Federal e a Justiça Federal. Sou muito sincero e espero que jamais qualquer um deles tenha sido utilizado como massa de manobra para qualquer tipo de intenção política ou qualquer outra que não seja a absoluta defesa da lei.
As colaborações premiadas têm feito muitas vítimas injustificadamente no Brasil, sem qualquer possibilidade de exercerem o seu direito constitucional de se defender.
No caso específico, eu sinto, com toda a sinceridade, que fui violado no meu direito à defesa, de esclarecer questões colocadas pelos colaboradores sobre fatos ilícitos que eles praticaram e que querem imputar a alguém para eventualmente saírem de suas responsabilidades, de suas punições.
Mas, de novo: por que inventariam e colocariam o nome do senhor especificamente nessas delações?
Eu era ministro de Estado [Baldy comandou o Ministério das Cidades de novembro de 2017 a dezembro de 2018] num momento de crise institucional profunda no Brasil, dada a situação do próprio presidente da República [na época, Michel Temer], de todas as ações de delatores e colaboradores [Temer foi delatado por Joesley Batista, da JBS].
Toda aquela circunstância pode ter sido, sim, uma indução. Pode ter alimentado o sentimento daqueles que cometeram ilícitos de buscar condições para saírem de suas penalidades.
A polícia encontrou R$ 90 mil em sua residência em Brasília, e outros R$ 110 mil em Goiânia nas operações de busca e apreensão realizadas na semana passada. Por que ter dinheiro em casa?
Eu sou empresário. Tenho minhas atividades lícitas, empreendedoras, que me permitem ter a condição de vida que tenho.
Nunca vivi do setor público. Todo o patrimônio que eu tenho é absolutamente declarado. Cada centavo que foi encontrado em cada uma das minhas casas está declarado no meu Imposto de Renda.
Então essa é a afirmação que tenho como fazer, como cidadão que cumpre com todas as suas responsabilidades perante os órgãos de controle.
Qualquer um pode ter recursos em casa, mas isso sempre gera um questionamento: qual era a necessidade?
É legítimo, é um direito você ter a sua propriedade e o seu patrimônio da maneira que desejar. Especialmente nesse momento em que a gente vive, de pandemia. Quando tudo começou, não sabíamos que tipo de situação viveríamos.
Sou curador dos meus pais. Ele tem 90 anos de idade e minha mãe tem 80. Os dois moram em Goiânia. Então para mim, longe, em São Paulo, com a vida que eu tenho, são pontos [que tornariam necessário ter o dinheiro em casa]. Eu nunca escondi. Está no meu Imposto de Renda. Se tivessem perguntado, [responderia]: está aqui, declarado, legalizado. É fruto de trabalho, suado, lícito e moralmente correto.
O senhor sabia que estava citado nessas delações?
Absolutamente. Nunca [ouviu dizer].
O senhor ficou dois dias preso. Como foi esse período?
Ser preso é ser preso. Passasse um minuto ou um ano, para mim representa o mesmo tipo de violência moral e à integridade que eu sempre preservei e busquei construir.
Como analisa o impacto que essa prisão terá na sua vida política, o senhor que já foi secretário de estado, deputado federal, ministro e que agora comandava uma secretaria importante no estado de SP, a de Transportes Metropolitanos?
Eu fiquei muito assustado. Fiquei completamente atordoado porque você recebe [investigadores] na sua casa, sem ter qualquer tipo de questionamento [anterior], sem a oportunidade de fazer qualquer tipo de esclarecimento.
E fico realmente muito triste. A legitimidade dessas colaborações e dessas atuações precisa ser objeto de reflexão profunda para que a gente não possa mais atacar cidadãos de bem sem que haja condição de exercer o direito de defesa.
Eu não tive e não tenho esse direito. Fui preso e condenado pela opinião pública sem que tenha sido instaurado um inquérito, um procedimento de investigação, sem que haja um processo contra mim.
Se me dessem a oportunidade, teria feito os esclarecimentos necessários no prazo mais exíguo possível, como agora estamos fazendo.
Eu não preciso da vida pública. Eu sempre faço a doação dos meus salários, sem transformar isso em promoção pessoal.
Mesmo jovem, já exerci cargos relevantes sem nunca ter sido questionado sobre minhas condutas nas funções que cumpri.
Todos os meus familiares sempre foram contrários a eu estar na vida pública. Justamente pela exposição, pelo risco que ela traz nessas questões de adversidades entre grupos políticos.
O senhor está licenciado da secretaria em SP. Pretende voltar ao cargo, caso prove a sua inocência? Vai seguir na vida pública?
A pergunta já mostra o quão controverso é o momento que estamos vivendo. Pela Constituição, os que fazem alegações contra você têm que provar a sua culpa. E não o contrário.
Eu tenho dois filhos, um de 15 e uma de 13. Tenho a minha mulher. Há uma exposição de onde você mora, de toda a sua vida pessoal. Foi algo realmente desnecessário do ponto de vista legal, constitucional, completamente excessivo e abusivo. É o momento de refletir se vale a pena estar na vida pública.
Então asua volta ao Governo de SP é incerta, independentemente do desfecho das investigações?
A minha volta vai ser motivo da minha reflexão sobre se vale a pena voltar à vida pública. Não é ao Governo de São Paulo. Mas a qualquer tipo de função.
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